segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Reino maravilhoso




assim o reino maravilhoso de que vos falei...o silêncio que se passeia pelos montes em tardes de sol...e às vezes por entre o taramelar da chuva... o brilho sonoro dos sorrisos puros em caras de pele curtida de sol a sol- É assim o reino maravilhoso em que habito... perceptível apenas a corações claros e com luz, a olhos atentos e a ouvidos entendidos na arte de escutar a música do silêncio..."






O Pássaro da Alma



No fundo, bem lá no fundo do corpo, mora a alma.
Ainda não houve quem a visse,
Mas todos sabem que ela existe.
E não só sabem que existe,
Como também sabem o que lá tem dentro.

Dentro da alma,
Lá bem no centro,
Pousado numa pata
Está um pássaro.
E o nome do pássaro é pássaro da alma.
E ele sente tudo o que nós sentimos:
Quando alguém nos magoa, o pássaro da alma agita-se para lá e para cá
(...)
Quando alguém nos ama,
O pássaro da alma dá pulinhos
De contente,
Para trás e para a frente,
Vai e vem.
Quando alguém nos chama,
O pássaro da alma põe-se logo à escuta da voz,
A fim de reconhecer que tipo de apelo é.
(...)
Decerto querem também saber de que é feito o pássaro da alma.
(...)
É feito de gavetas e mais gavetas. (...) cada uma delas tem uma chave para ela só!
(...)
Às vezes uma pessoa pode escolher e indicar ao pássaro
As chaves a rodar e as gavetas a abrir.
E outras vezes é o pássaro quem decide.
Por exemplo: a pessoa quer estar calada e diz ao pássaro para abrir
A gaveta do silêncio. Mas ele, por auto-recriação,
Abre-lhe a gaveta da fala,
E ela desata a falar, a falar sem querer.
(...)
Agora já compreendemos que cada homem é diferente do seu semelhante
Por causa do pássaro da alma que tem dentro de si.
O pássaro que em certas manhãs abre a gaveta da alegria,
E a alegria jorra dela para dentro do corpo
E o dono dela fica feliz.

E o mais importante - é escutar logo o pássaro.
Pois acontece o pássaro da alma chamar por nós, e nós não o ouvirmos.
É pena. Ele quer falar-nos de nós próprios.
Quer falar-nos dos sentimentos que estão encerrados nas gavetas dentro de nós.

Por isso vale a pena
Talvez tarde pela noite, quando o silêncio nos rodeia,
Escutar o pássaro da alma que mora dentro de nós,
No fundo, lá bem no fundo do corpo.

Michal Snunit



Bem digo, durante a noite, ao meu pássaro da alma para ele abrir a gaveta da fala, mas ele, teimoso, insiste em abrir a do silêncio...e lá vou passando os dias mais caladita...!









domingo, 2 de novembro de 2008




E a vida foi, e é assim e não melhora.
Esforço inútil. Tudo é ilusão.

Quantos não cismam nisso mesmo a esta hora
Com uma taça, ou um punhal na mão!

Mas a Arte, o Lar, um filho, António? Embora!
Quimeras, sonhos, bolas de sabão.
E a tortura do Além e quem lá mora!
Isso é, talvez, a minha única aflição.

Toda a dor pode suportar-se, toda!
Mesmo a da noiva morta em plena boda,
Que por mortalha leva...essa que traz.

Mas uma não: a dor do pensamento!
Ai quem me dera entrar nesse convento
Que há além da Morte e que se chama A Paz!


António Nobre